Espiritualidade verde e a saída do apocalipse climático – 19/09/2024 – Cotidiano


A crise climática não está destruindo apenas ecossistemas, ela está queimando e afogando a esperança de futuro da humanidade. A interrogação desta geração é: como ter esperança num mundo que ora está queimando, ora está se afogando em enchentes?

Seres humanos precisam da esperança para viver, pessoas que sobrevivem às catástrofes precisam de esperança para voltar a florescer na vida. A esperança para os seres humanos é tão vital quanto uma lufada de ar limpo para quem está sufocando na fumaça de um incêndio.

A primavera deste ano chega com o país queimando em diversas regiões. Vidas humanas, fauna e flora são devoradas pelos incêndios. As partículas de fumaça viajam centenas de quilômetros levadas pelos ventos, cobrem cidades inteiras e agravam problemas respiratórios, levando aos hospitais principalmente crianças e idosos. Porém, além dos danos físicos, há consequências para a saúde mental da população.

Em 2022 a OMS (Organização Mundial da Saúde) passou a recomendar que os países incluam apoio à saúde mental no enfrentamento da crise climática. Dentre as diretrizes está a busca pelo fortalecimento dos sistemas de apoio social e cultural existentes nas comunidades, aproveitando o conhecimento tradicional e as redes de solidariedade para promover a resiliência psicossocial.

As religiões, por meio da espiritualidade e da vida comunitária, oferecem força para enfrentar as catástrofes e confiança de que um futuro melhor pode ser construído. São recursos preciosos para a saúde mental.

Costumo chamar de “espiritualidade verde” a perspectiva de vida, religiosa ou não, que reverencia a inseparabilidade entre a vida humana e a vida do planeta. Quando agredimos a Terra, ferimos a nós mesmos. Basta olhar a raiz de algumas palavras. Na língua hebraica Adão, o primeiro vivente, é adam, e a palavra terra é escrita adamah, a mesma raiz para ambos. Em latim homem é homo e solo é humus, a mesma raiz para os dois.

A missão de quem cultiva a espiritualidade verde é compartilhar esperança com as pessoas que sentem seu futuro ameaçado. A questão é: como isso pode ser feito de modo concreto ultrapassando os discursos edificantes? Penso nas seguintes ações para preservação e florescimento da nossa esperança nessa primavera em chamas.

O acolhimento dos nossos medos, ansiedades e incertezas quanto ao futuro da humanidade é um bom começo para quem quer mudar de direção. Ansiedade e medo não são ruins quando nascem de ameaças reais e mobilizam nossas forças para ações de enfrentamento das causas dos problemas.

Em segundo lugar, cada um de nós pode escolher ações cotidianas para combater a crise climática. Não nos faltam informações sobre a crise climática; faltam atitudes para reduzir, por exemplo, o consumo de água, de carne, de energia etc. É possível ressignificar essas pequenas mudanças diárias como liturgias de celebração da vida e da esperança.

A solidariedade é fundamental para construir um futuro menos doloroso diante da crise climática. Os mais vulneráveis, como pessoas em situação de pobreza, crianças e idosos, são os que mais sofrem com os impactos da mudança do clima. Ajudar essas populações é a terceira ação essencial para nutrir a esperança.

Essa solidariedade pode se manifestar de diversas maneiras: desde doações para situações de emergência climática até o apoio à criação e à aplicação de políticas públicas que combatam tanto as consequências quanto as causas das injustiças climáticas.

A esperança não é a certeza de que as coisas darão certo no futuro, mas sim a convicção de que vale a pena lutar, como ensinou o teólogo Jürgen Moltmann. Não sabemos se dará certo. Os sinais de fumaça, contudo, avisam que a rota atual leva à autodestruição da humanidade.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *