EUA: marcas lutam por fusão bilionária no setor da moda – 19/09/2024 – Mercado


A marca de luxo Michael Kors estreou sua última coleção na Semana de Moda de Nova York na última terça-feira (10) diante de uma plateia repleta de estrelas, incluindo Anna Wintour, da Vogue. A poucos quarteirões de distância, o pano subiu para um espetáculo diferente envolvendo a marca.

Em um tribunal no centro de Manhattan, os proprietários das grifes Michael Kors e Coach estavam lutando para permitir uma fusão multibilionária que colocaria várias marcas de moda conhecidas sob o mesmo teto.

A Tapestry —que possui Coach, Kate Spade e Stuart Weitzman— concordou no ano passado em comprar a Capri —dona das marcas Michael Kors, Versace e Jimmy Choo—, enquanto muitas empresas do mundo da moda enfrentavam queda nas vendas após o fim da tendência de compras da pandemia.

No entanto, o acordo proposto para a Capri está em um limbo desde que a FTC (Comissão Federal de Comércio) entrou com um processo para bloquear a fusão de US$ 8,5 bilhões (R$ 46,4 bi) há cinco meses. O julgamento em Manhattan este mês ajudará a determinar se a aquisição pode prosseguir conforme o planejado.

Especialistas acreditam que este é o primeiro grande caso antitruste a atingir a indústria da moda —setor notório por tendências e fortunas voláteis. Se os reguladores tiverem sucesso em impedir a união, o caso pode ter implicações graves para as casas de moda globalmente e impedir aquisições em série similares aos negócios que construíram gigantes europeus como LVMH e Kering.

Qualquer cliente interessado em comprar um concorrente direto, mesmo que haja muitos outros no mercado, enfrentaria um grande risco regulatório, disse George Paul, sócio da White & Case.

Caso o regulador vença este caso, “se houver esse tipo de linguagem nos documentos, não importa qual seja o mercado de produtos, você deve se preocupar em ser processado”, acrescentou ele. “Porque enquanto forem substitutos próximos, a FTC parece estar desconsiderando a capacidade do consumidor de realmente fazer a troca” para outras marcas.

Os reguladores construíram o caso em torno de uma fatia do mercado que definem como “luxo acessível”: bolsas que são relativamente acessíveis, mas de boa qualidade, e que geralmente custam entre US$ 100 (cerca de R$ 546) e US$ 1.000 (cerca de R$ 5.460) .

Eles argumentam que a fusão resultaria em preços mais altos para os consumidores e uma qualidade inferior nos produtos, “levando a uma concentração indevida e uma presunção de ilegalidade”, porque algumas das marcas competem diretamente, afirmam os documentos judiciais.

No entanto, as empresas insistem que o mercado de bolsas hoje em dia é altamente competitivo. Suas testemunhas declararam que não só existem centenas de outras marcas, mas que compradores de diferentes rendas compram bolsas de todos os preços.

Coach e Michael Kors não estão apenas disputando vendas com outras empresas em sua faixa de preço —eles também estão competindo contra todos, desde a Celine, de alto padrão, até o eBay.

Embora o julgamento seja um precursor de outros procedimentos oficiais, espera-se que a decisão do tribunal seja determinante, pois a fusão precisa ser concluída até fevereiro. A fase final de testemunhos foi concluída esta semana, e cada lado apresentará seus argumentos finais em 30 de setembro.

A juíza distrital dos EUA Jennifer Rochon tomará uma decisão nos próximos meses sobre congelar o acordo ou não.

Desde que Lina Khan assumiu a liderança da FTC em 2021, a agência não hesitou em tentar bloquear grandes negócios, atacando fusões entre Nvidia e a designer de chips Arm, os gigantes de supermercados Kroger e Albertsons, e a empresa de biotecnologia Illumina e a startup de triagem de câncer Grail.

Embora Tapestry e Capri estejam no centro do caso, elas não são as únicas que apareceram no julgamento. Outras marcas de moda globais, incluindo Prada, Chanel e a esportiva Lululemon, foram envolvidas nos procedimentos, com muitas delas intimadas a fornecer documentos, testemunhos de especialistas ou ambos.

Joanne Crevoiserat, CEO da Tapestry, testemunhou por quase três horas na semana passada. Ao lado do banco das testemunhas estavam carrinhos bege com dezenas de bolsas —que serviram como provas legais.

Um advogado da empresa pediu a Crevoiserat que levantasse alguns dos produtos da empresa diante do tribunal para mostrar suas diferenças. Ela exibiu a bolsa Coach Rogue, que pode custar US$ 1.095 (R$ 5.981), e uma bolsa xadrez branca e verde da Kate Spade. “Talvez eu consiga vender algumas bolsas hoje”, brincou.

Crevoiserat disse que a competição entre as marcas persistiria mesmo se elas estivessem sob a mesma propriedade. “O acordo simplesmente não faria sentido se todas as marcas não pudessem crescer”, acrescentou.

O caso também destacou a natureza sempre mutável do mercado de bolsas, já que até mesmo consumidores ricos estão recorrendo a opções mais populares, como a mini-tote bag de US$ 2,99 (R$ 16,30) da Trader Joe’s e a “belt bag” de US$ 38 (R$ 207)da Lululemon. As redes sociais —onde novos participantes podem vender diretamente aos consumidores— e o mercado de revenda também alteraram dramaticamente o cenário.

Embora haja muitos concorrentes, os reguladores tentaram mostrar que, juntos, Michael Kors, Kate Spade e Coach dominam o mercado, ocupando “bem mais de 50% nas vendas de bolsas de ‘luxo acessível’ nos EUA”.

No entanto, determinar exatamente como os consumidores compram acessórios de moda será um grande desafio. “Os gostos dos consumidores são muito complicados e as modas mudam. Então, é o tipo de caso que realmente não se encaixa bem na lógica binária das definições de mercado”, disse um ex-fiscal antitruste.

Como ambas as empresas são de capital aberto, seus preços de ações refletem a confiança dos investidores de que o acordo será concluído, o que envolveria a Tapestry comprando a Capri a US$ 57 (R$ 311) por ação —um prêmio de aproximadamente 40% em relação ao preço atual. As ações das duas empresas subiram desde o início do julgamento.

A Michael Kors, fundada em 1981, é um exemplo de marca que lutou para se manter. Em alguns casos antitruste, empresas tentam argumentar que uma das envolvidas precisa da fusão para sobreviver, chamada de “defesa de empresa falida”.

Embora a Michael Kors não esteja em uma situação financeira desesperadora, os advogados da Tapestry e da Capri argumentaram que sua força histórica recentemente se dissipou.

O próprio Michael Kors foi ao tribunal para falar da evolução da marca desde que ele a fundou há mais de quatro décadas e de onde ela está hoje. Ele disse que a empresa sofreu recentemente de “fadiga de marca” e suas tentativas de reenergizar os consumidores atingiram um “estágio de estagnação”.

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