PA e PR são opostos na doação de órgãos no país – 19/09/2024 – Equilíbrio e Saúde


Aproximadamente 3.000 quilômetros separam Renutmilly Braga de Oliveira, 8, de Nilson José Dybas, 52. Distantes estão também suas histórias. A menina de Altamira, no Pará, espera desde os dois anos de idade por um transplante de rim. O empresário de Campo Largo, no Paraná, passou por dois transplantes de fígado, em 2015 e 2020, e aguardou menos tempo do que a média dos pacientes.

Pará e Paraná são extremos opostos na realidade da doação de órgãos no país. O Paraná é o estado com maior número de doações por milhão de população (pmp) no país, segundo a ABTO (Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos).

De janeiro a junho, registrou 42,3 doações pmp, seguido por Rondônia (40,5) e Santa Catarina (40,7). A média nacional é de 19,5 pmp. Os piores são Amazonas (3,6), Mato Grosso (4,4) e Pará (4,9).

No Paraná, de cada cem famílias que enfrentam a situação de autorizar ou não a doação de órgãos do parente com diagnóstico de morte encefálica, 25 dizem não. A taxa de recusa familiar é a menor brasileira, segundo a ABTO. No país como um todo, a média atual de recusa é 45%. No Acre, chega a 77%.

A justificativa mais comum para um familiar não autorizar tem sido a dúvida sobre se isso era algo de fato desejado pelo paciente que morreu, conta a coordenadora do SET-PR (Sistema Estadual de Transplantes do Paraná), Juliana Ribeiro Giugni. “Por isso a nossa campanha de doação de órgãos é um pedido para que as pessoas falem em vida sobre isso, deixem claro para a família que é um doador”.

“É claro que existem diferentes motivos [para alguém não autorizar a doação de órgãos], como religiosos, por exemplo. Mas grande parte tem relação com o desconhecimento sobre o desejo da pessoa que morreu. E hoje, no Brasil, a doação de órgãos só acontece com a autorização da família”, continua Giugni.

Segundo a coordenadora-geral do SNT (Sistema Nacional de Transplantes) do Ministério da Saúde, Patrícia Freire, há vários fatores influenciando as diferenças na doação de órgãos em cada estado.

“Alguns estados estão com seus programas de transplantes mais avançados do que outros. Porque tem estado que iniciou seu programa mais tarde e ainda organiza seus processos. E em algumas regiões do país há desafios adicionais, como lugares onde só é possível se chegar de barco, por exemplo”, cita.

“E é uma luta contra o tempo. Na hora que o médico retira o coração de um doador, ele já tem que estar batendo no peito do receptor em no máximo 4 horas”, diz.

A paraense Renutmilly, 8, desde o primeiro ano de vida depende da hemodiálise para viver, quando descobriu que tinha uma má formação no trato urinário. A família se mudou para Marituba para que ela fizesse diálise quatro vezes na semana na Santa Casa de Belém. Cada sessão dura quatro horas.

A mãe, a dona de casa Rosiani Braga, 35, conta que Renutmilly está cadastrada na central de transplantes desde os dois anos e chegou a ser chamada por duas vezes —em 2022 e ano passado, dia 26 de dezembro.

“Na primeira vez, não estava apta para receber porque estava com infecção, tomando antibiótico e saiu da lista. Em dezembro do ano passado ela foi chamada novamente. Estava tudo certo para fazer, fez todo o processo, foi compatível, mas como era a sexta da lista deram prioridade para os dois primeiros”, conta.

Ao longo do tempo, a saúde da menina ficou cada vez mais debilitada, diz. Principalmente depois de ter que tirar o rim esquerdo, por atrofia. “Quanto mais o tempo passa, mais ela fica debilitada. Tem dia que está bem, outros que amanhece com a pressão alta ou muito cansada”, lamenta a mãe.

Hoje, a menina se alimenta por sonda, e quase não passeia. Precisa ser carregada, porque a doença atingiu os ossos. Com a saúde prejudicada, Renutmilly teve que interromper os estudos no ano passado.

“A minha maior preocupação é que a gente sabe que o tratamento vai ser a vida inteira e tenho medo que ela não consiga viver com todas essas limitações. Hoje o que eu mais queria [era o] transplante. [Ele] não é uma cura, é um tratamento, mas vai dar uma qualidade de vida bem melhor a ela”, desabafa a mãe.

A menina conta que sonha em conhecer a cidade onde nasceu, Altamira. “O que eu mais queria era fazer o transplante para poder conhecer minha família e a minha cidade, poder andar de bicicleta”, diz.

Em nota, a Secretaria de Estado de Saúde do Pará diz que promove campanhas de conscientização e que o número de transplantes no estado tem aumentado significativamente, com 223 procedimentos em 2021, 272 em 2022, e 613 em 2023. Até julho de 2024, já foram realizados 376 transplantes.

Já em Campo Largo (PR), o empresário do ramo da construção civil Nilson José Dybas, 52, passou por dois transplantes de fígado, em setembro de 2015 e em novembro de 2020, e esperou menos do que a média.

“Meu médico disse que tive sorte porque meu tipo sanguíneo é raro [AB+]. Entrei na fila na 3ª posição e em 33 dias fui transplantado”, diz, em referência ao primeiro transplante, feito em decorrência de uma esteatose hepática. Ele descobriu o diagnóstico depois de um mês internado em Curitiba, quando recebeu a indicação para o primeiro transplante.

Quase cinco anos depois, começou “uma coceira no corpo”, conta Dybas. “Era um entupimento nas vias biliares. Fiz um tratamento de meses, mas não tive sucesso. Tive que entrar na fila de transplante de novo”, relata. Esperou 37 dias até conseguir fazer um segundo transplante.

Hoje ele leva vida normal. Só faz exames a cada seis meses, para monitorar a situação, e se engaja em todas as campanhas sobre doações de órgãos. “Eu sei que tem uma orientação, que a gente não pode saber qual família doou. Mas eu tenho vontade de agradecer [ao meu doador]”, completa.

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